Ilustração de Jacek Yerka. |
A
temporada eleitoral já passou; é o quanto venho procrastinando este
texto. Com o estabelecimento do teto para gastos da união e o novo
ensino médio, porém, talvez fosse interessante deixar o recado.
Assim, o texto pode se tornar relevante na próxima temporada
eleitoral.
Antes
que alguém pergunte, não gosto nem do teto de gastos nem do novo
ensino médio. Mas, aprendi, esses dias, que não se deve discutir
política, mas votar. Então, posso pelo menos falar de como votar,
em vez de entrar em detalhes sobre essas coisas. Talvez até entre,
mas noutra ocasião.
Primeiro,
é necessário verificar se está presente a condição para que a
reeleição seja possível. Se a reeleição é possível, é
necessário verificar se, no período anterior, o candidato fez um
bom trabalho ou não. Para avaliar isso, é necessário ter
critérios, que são pessoais. É importante frisar o caráter de
pessoalidade dos critérios, porque as notícias, sendo facilmente
manipuláveis, não constituem critério de avaliação de um
governo, senão as consequências sensíveis da administração. Isso
quer dizer que eu não devo me perguntar se o governo vai bem no
Brasil inteiro ou na maior parte do Brasil, o que requereria buscar
informações nos noticiários, mas se o governo vai bem pra mim,
tão-somente.
A
pessoalidade do voto tem dupla função: afastar o indivíduo de
possíveis mentiras e garantir a democracia. Como disse, as
notícias e a opinião dos outros podem ser manipuladas, corresponder
à verdade apenas parcialmente ou simplesmente não ser o que você
observa. Então, se expor às opiniões dos outros e às
notícias pode servir como meio de levar o indivíduo a ver coisas
que não estão lá. Por outro lado, dar esse caráter de
pessoalidade ao voto garante uma democracia mais justa: se a maioria
das pessoas, em suas experiências pessoais, verifica, através de
seus critérios pessoais, que o governo vai mal, essa maioria, pelo
poder do voto, motivado por interesses pessoais, retira do governo
aquilo que lhe faz mal. Muito se fala que a mídia de massa é
manipuladora, mas as pessoas, nem por isso encaram o noticiário de
maneira crítica. Então, se a televisão tem interesses, ela usará
seu aparato midiático para manipular a opinião da maioria, o que
não aconteceria se o noticiário não constituísse critério de
avaliação política, mas somente a experiência pessoal. A
manipulação de massa constitui vantagem desleal e, por extensão,
uma perversão da pureza democrática. Um julgamento democrático
"puro" requer que o indivíduo vote por ele mesmo. Afinal
de contas, se a maioria, por esse processo, reprova ou aprova o
sistema estabelecido, a democracia é propriamente feita: é a
opinião da maioria falando pela própria maioria, que vê as coisas
pelos seus próprios olhos e não pelos olhos dos outros.
Os
meus critérios são sempre: educação, saúde e segurança. Se a
educação funciona pra mim, então ele (o último candidato eleito
que procura reeleição) fez um bom trabalho na educação pra mim;
da mesma forma, então ele fez um bom trabalho na saúde pra mim, e
fez um bom trabalho na segurança pra mim. Para determinar se
essas coisas vão bem, eu ajo de maneira pragmática: a educação
vai bem se eu aprendi satisfatoriamente o que eu queria, a saúde vai
bem se eu recebi tratamento satisfatório para minhas doenças,
a segurança vai bem se eu não fui vítima de violência. Se as três
condições forem preenchidas, então devo reeleger o último
candidato eleito. Se as três condições não forem preenchidas,
então para onde foi o dinheiro público? Ou foi mal usado ou
desviado. Não reelegerei. Se ele for bem em apenas um ou dois
critérios, devo pesar perdas e ganhos. Se os benefícios cobrirem os
malefícios, devo reeleger. Caso contrário, não.
Outras
pessoas têm diferentes critérios e isso é importante, pois o
governo ideal pra mim não é o governo ideal para outros. Muitos têm
como critério a mobilidade urbana, o meio ambiente, a economia,
os empregos, entre outros. É importante que cada um tenha seus
critérios, mas ainda mais importante é que esses critérios sejam
pessoais e que avaliem a experiência pessoal do cidadão com o
governo. Não vote pelo Brasil inteiro; se cada um vota por si, já
vota pelo Brasil inteiro, mas, procurando votar segundo a
opinião do outro, pode-se acabar votando por uma minoria, o que é o
contrário da democracia.
Segundo,
caso o candidato que tenta se reeleger falhe nos meus critérios,
caso haja vários candidatos dentre os quais escolher ou caso o
último candidato eleito não procure ou não possa se reeleger, é
necessário pesquisar qual dentre os candidatos disponíveis é mais
qualificado. Isso também é feito segundo critérios, que devem
também ser pessoais. Em páginas que catalogam candidatos na
Internet, é possível ver algumas informações sobre cada
candidato: idade, profissão, filiação partidária, "nome de
guerra" e ficha criminal por exemplo. Além disso, um bom jeito
de obter informações sobre um candidato é ouvindo o que ele
tem a dizer, via propaganda política e debates, e o que os outros
candidatos dizem dele. Enquanto não é lícito ouvir fontes de
terceiros, mesmo quando se dizem imparciais, é lícito ouvir os que
estão inseridos na competição. Pela propaganda política e
sobretudo pelos debates, eu posso saber quem tem mais chances de
preencher os critérios pessoais que não foram preenchidos na
etapa anterior.
Antes
de julgar seriamente, devemos eliminar do julgamento todos os
candidatos que têm nomes políticos jocosos ou propositalmente
engraçados, que tenham propagandas políticas que faltam com o
decoro, com a seriedade, que façam piada ou que infundam um ar de
comédia a um assunto tão sério. O último que fez isso e se deu
bem, se mostrou uma decepção. Meu primeiro critério pessoal é
ficha criminal: um candidato que já cometeu crimes políticos ou que
tenham relação com a política local, deve ser evitado. Se ele
cometeu outros crimes, não políticos e não relacionados à
política, é justo lhe dar uma chance. O segundo critério, para
desempate do primeiro, é a profissão. Prefiro sempre os candidatos
que têm profissões públicas, não por serem melhores ou piores,
mas porque, para novos candidatos, me é urgente assegurar que eles
terão preferência pelas coisas públicas: o Estado se ocupa do que
é público e apenas secundariamente do que é privado. Assim, eu não
iria querer um Estado que descuida das coisas públicas, que são
dele, para cuidar das coisas dos outros, embora nem por isso as deva
atrapalhar ou destruir. Então, o público deve ter prioridade sobre
o privado e profissionais públicos sabem das vicissitudes
encontradas em seus ofícios, o que significa que eles têm
clarividência, ao menos, dos problemas que devem ser enfrentados na
coisa pública. Filiação partidária é o critério seguinte, o
qual é usado para desempatar caso haja empate no critério anterior.
Isso porque filiação partidária não diz muito hoje: com
candidatos mudando de partido, às vezes como quem muda de roupa, é
possível ver que "ideologia de partido" é um conceito
desacreditado. Ainda acontece, é verdade, mas não com
frequência a ponto de filiação partidária ser primeiro
critério. Eu diria de quais partidos eu gosto se isso não
contradissesse o que eu disse no começo sobre não acatar
recomendações de candidato de terceiros.
Resumindo,
temos o programa de dois casos. Caso 1: reeleição possível. Caso
2: reeleição impossível.
Caso
1: candidato fez bom trabalho em todos os critérios pessoais,
reeleger. Se o candidato não fez um bom trabalho em todos os
critérios pessoais, verificar perdas e ganhos do último mandato. Se
o candidato não fez um bom trabalho em nenhum critério pessoal, não
reeleger, seguir para caso 2.
Caso
2: eliminar todos os candidatos que não são sérios. Verificar
quais candidatos atendem ao primeiro critério pessoal, eliminar
os que não atendem e prosseguir. Verificar quais candidatos dos que
sobraram atendem ao segundo critério pessoal, eliminar os que não
atendem, prosseguir. Continuar testando todos os candidatos e
eliminando aos que não atendem aos critérios pessoais, em ordem do
mais importante ao menos importante. Caso faltem critérios e nenhum
dos candidatos restou, anule seu voto. Caso faltem critérios e ainda
há empate, tanto faz.
Yure Cézar de Moura Almeida
Redação
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